Ari o Burro | A metamorfose

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Habituado à paz da sua preenchida vida espiritual, nem mesmo toda a informação que a igreja lhe forneceu sobre a vida depois da morte preparou o Burro para a tragédia que se aproximava. Como uma vela que se apaga com o soprar do vento, lady Di sucumbiu aos ferimentos e deixou o nosso jumento à procura do seu Deus bondoso que levou para junto de si a musa das musas. Decorria o ano de 1997 e se tudo aparentava seguir um rumo catastrófico o cosmos decidiu reequilibrar-se e provar que se Deus pai tira com uma mão, dá com a outra. Foi nesse mesmo ano que os irmãos Rosado venceram o programa “Casa de Artistas” e foi esta justiça divina que devolveu a felicidade e o brilho aos olhos do Burro.

Este novo fôlego veio repor a ordem e trazer romance à vida de um Burro solitário. Até aqui embrenhado numa seita que lhe absorvia todo o tempo e dedicação, tomou como sua esta banda sonora e abraçou a curiosidade pelo sexo oposto. O Burro decidiu encontrar a cara-metade e resolveu mudar alguns aspetos da sua vida. Primeiro lugar, cortar o buço que o acompanha desde tenra idade. Segundo lugar, adquirir um penteado à la Nick Carter. Terceiro, roupa de marca, mais concretamente uma sapatilhas de basket com caixa de ar. Finalmente equipado a rigor, iniciou o seu caminho na arte de sedução mas em boa verdade, sem grande sucesso. Vistas bem as coisas, alterar a letra do genérico de abertura da Sic e fazer com isto uma serenata não figurará propriamente nos manuais do engate.

Ari não começou bem, mas foi aperfeiçoando as suas armas. Um pouco à imagem dos irmãos Rosado que largaram os Sétimo Céu para construírem o projeto Anjos, o Burro amadureceu e lá foi roubando um beijo aqui e ali, viu os primeiros seios e experimentou as primeiras desilusões amorosas. Foi sem surpresa que começou a desenvolver um interesse por sexo mas sem namorada afigurava-se difícil satisfazer tais impulsos. Coincidência ou não, em 1999 os Anjos lançam o álbum “Ficarei” e o asno Ari conhece uma burra. O clima é notório, as trocas de olhares, os sorrisos comprometidos, a tensão. Tudo muito bonito, não fosse o facto de a burra namorar com um burro anão. Talvez tenha sido este o momento de rutura com os valores religiosos que lhe tinham incutido. Decidir entre os desejos libidinosos e o que está certo segundo os 10 mandamentos. A clivagem foi ainda maior. Numa bela tarde de primavera, ao som de Ivete Sangalo, o Burro praticou pela primeira vez o coito, deixando para trás os tempos de menino e paixão pelos irmãos Nélson e Sérgio.

Talvez estas mudanças não sejam, aos olhos do mundo, as que mais se fizeram notar mas certo é que abalaram as fundações do Burro. Hoje já não pratica o coito ao som da “Se eu não te amasse tanto assim” e escolhe burras sem namorado. Mas foi a liberdade de o poder fazer que o mudou. E à medida que a idade avança mais certo está disso. Não é o passar dos dias que traz a certeza absoluta das coisas. E se burro velho não aprende línguas, pelo menos que aperfeiçoe o que a língua faz.