Bandit Room III: Melhor rambóia desde D. João VI
Apesar de ser apreciador de uma boa festa admito que, quando o meu nome foi sugerido para fazer o rescaldo da terceira edição da Bandit Room, dúvidas sobre se seria a pessoa indicada assombraram a minha mente. Vejamos, eu não sou propriamente um especialista em música electrónica (consegui chamar ao Techno de Detroit Techno de Boston — é, também não sou grande pistola a geografia) muito menos da vertente dançável da coisa. Contrariando o instinto básico de qualquer jovem pós-puberdade, a ideia de passar a noite fechado num lugar escuro, cheio de gente com as hormonas aos saltos a suar e a roçar-se ao som de música repetitiva, nunca me fascinou por aí além. Isso, e a minha lendária descoordenação motora que me torna, em técnica e subtileza, uma espécie de Binya do dancefloor, mantiveram-me afastado e desinteressado no movimento. No entanto, o facto de entrar com convite e a perspectiva de sacar copos de borla à organização — há que tratar bem a imprensa — foram suficientemente aliciantes para me fazer aceitar a tarefa.
Serve este pequeno aparte para explicar que esta review carece, portanto, de detalhes técnicos. Não sei que subgéneros se dançou, não sei nomear uma única malha que os DJs passaram — lacuna que seria facilmente compensada com duas ou três mensagens, sim, mas ia estar a falar de assuntos que não domino — mas sei o que é juntar um grupo de amigos e tentar criar algo diferente. Sei todo o esforço, dedicação e coragem necessários para arriscar uma empreitada assim numa cidade destas, sei o que é meter dinheiro do próprio bolso à confiança e esperar que corra tudo bem, sei o que é serem horas a montar o material e faltar uma filha da mãe de uma extensão para ligar a coluna. E meus bandidos tiro-vos o chapéu, organizar uma festa é com vocês! Aquele palacete já não via estes níveis de rambóia desde que El-Rei e sua comitiva — vindos da noite em Vigo — lá decidiram pernoitar e fazer a after, dois séculos antes [carece de fontes]. G’anda ambiente, até o segurança era um fixe, bom aproveitamento do espaço, bebidas que não custavam o preço de um lanche, um razoável rácio babe/maninho — embora ainda longe dos números praticados mais a leste — e sonoro suficientemente cativante para manter o dancefloor a bombar desde a sempre complicada abertura de uma casa ainda a encher, cortesia de Vitor Saguanza, passando pelos vinis de Marco Coelho e terminando na explosão de confettis da actuação de Vasco Valente. Terminando como quem diz, já que ainda houve tempo e energias para um back to back e back to back to back por parte destes bandidos convidados, que, por vontade da maioria, bem podia ter durado até ao meio-dia. Sim, minha gente que por alguma razão não esteve presente, foi assim tão bom. Foi uma daquelas noites em que as horas passavam e pareciam sempre duas da manhã. Para a próxima já sabes. E já que falamos em próxima, bandidos eu sei que isto vai um pouco contra o espírito espontâneo da coisa mas, pá, era uma destas por mês. Vejam lá isso.
Nota positiva para o público que compareceu e soube encher o palacete — um dos melhores espaços da cidade — e, tirando o total desrespeito pela proibição de fumar na sala (não há milagres), no geral se soube comportar. Já se sabe que ambientes destes tendem a ser explosivos e chegaram relatos de um ou dois desacatos, mas sinceramente não me apercebi de nada, provavelmente por estar demasiado distraído a divertir-me. Uma palavra também para o novo pessoal da ABC da Cultura que aproveitou a ocasião para alargar a festa ao resto do edifício com os seus próprios DJs (boa cena) e lutou estoicamente, de esfregona e balde em punho, contra as ondas de urina e refluxo gástrico que assolaram aquele WC — só uma sanita por divisão e a cerveja além de diurética tem tendência a afectar a pontaria, mais uma vez não há milagres.
Uma última adenda para a atribuição do clássico galardão para “Melhor Frase da Festa” que nesta edição vai para o indivíduo que me confessou que “as gajas de Arrabães são todas carpinteiras”. Já na categoria “É Que é Já Aqui” temos um empate técnico entre o gajo que mijou no corredor e o casal apanhado a fazer o amor numa das salas adjacentes.
(A votação foi acompanhada por auditores independentes que garantem a legalidade do processo. Em caso de dúvida ou reclamação — uma vez que o IP4 ainda não têm um provedor — podem sempre escrever tudo num papel, dobrar bem dobradinho e guardar na mesinha de cabeceira.)
Adorei.