Entrevista | Peixe:Avião

Três anos depois de os Peixe:Avião terem lançado Madrugada, eis que o último mês de Setembro decidiu presentear-nos com o terceiro álbum da banda bracarense – o homónimo Peixe:Avião. Foi o tempo necessário para uma maior maturação, é verdade, o que permitiu algo tão simples como ser este o projecto que menos dependeu de composições individuais. Estão, portanto, num momento de maior coesão. Isto é interessante acontecer, justamente, ao terceiro álbum. Luís Fernandes já havia confessado que Avesso, o tema de avanço, tem um lado dançável, um caminho novo a explorar. Já se assinalou inúmeras vezes, também, o rock mais cru em que se alicerça o disco. Agora, o que é de se lhe o chapéu é isto: as composições, as estruturas das canções são simples e não se abstêm de transparecer as características de composição mais comuns do rock, mas há, depois, um piscar de olho a uma roupagem, digamos assim, quase electrónica. Dia 22 podem comprovar tudo isto no concerto que a banda dará no Teatro de Vila Real. Entretenham-se, por enquanto, com a pequena conversa que tive com José Figueiredo, o baixista, durante a qual até descobri a sua costela transmontana.

peixe aviao foto

Há quem diga que o terceiro álbum acaba por ser uma prova dos nove para as bandas. Compreende-se, porque é quando se começa a exigir maturação, coesão e diferenciação. Pergunto-te se os Peixe:Avião pensaram nisso porque a verdade é que, neste terceiro disco, há coisas novas, e nota-se até pela estética e imagem do álbum. Assume uma ambiência noir. Este ser o vosso terceiro álbum pesou nas vossas escolhas e direcção a seguir?

Foi um processo interno, não foi para provar nada a ninguém. A razão foi para nos mantermos, a nós próprios, interessados e motivados. Achámos que precisávamos de melhorar ou modificar algumas coisas para nos mantermos motivados, frescos. Sentíamos que estávamos a fazer alguma coisa para nos surpreender a nós próprios.

Mas também deve haver sempre, enquanto banda, aquela preocupação interna de renovação.

Exactamente. Temos um conjunto de processos, e quando começam a funcionar de forma simples e sem desafio, também é natural que nos deixemos de sentir motivados e desafiados. Por isso é que decidimos enveredar por outros caminhos, para as coisas continuarem interessantes.

O mais engraçado é que juntam a linguagem de um rock mais cru com a exploração de um lado mais electrónico e, pode-se dizer, dançável. Aliás, chegaram a confessar isso mesmo. Esse lado mais cru do rock, no entanto, prende-se com o processo de composição, da estrutura das canções.

Sim, é um disco mais cru e mais instintivo. Acho que é por causa disso que soa mais rock, não é por, sei lá, ter guitarras com mais distorção ou qualquer coisa assim. Acho que tem a ver com essa crueza.

O mais curioso é que aproveitam, ao mesmo tempo, por não descurar de uma linguagem um pouco mais electrónica.

Sim. Também o que torna as coisas originais é essa mistura de várias coisas diferentes. Ainda bem que achaste interessante por isso porque, de facto, se calhar até tem tempos pelo meio mais lentos e com mais espaço — há várias coisas cruzadas. Eu, pessoalmente, e acho que é a opinião de todos, sinto que o lado mais rock vir ao de cima é, realmente, na crueza dos arranjos, nas espontaneidade das coisas. Tem muito a ver, também, com o facto de ter sido composto em ensaios e menos em frente ao computador.

É verdade que este álbum partiu menos de composições individuais?

Sim, partiu muito da ideia de ensaio sem sequer haver muitas ideias pensadas. Isso é mesmo muito verdadeiro. Não teve quase nada levado de casa.

Significa que estão num momento importante em que a banda está mais coesa.

Sim, também foi importante nesse sentido. Mas foi um processo difícil. Tínhamos as coisas a funcionarem de uma certa maneira e obrigou-nos a trabalhar muito, procurar até encontrarmos, entre nós, um novo equilíbrio. Mas isso, também, é o que torna as coisas interessantes, o que nos ajuda a redefinir enquanto grupo de pessoas. Por isso, foi mais estimulante até.

Houve um hiato de três anos relativamente ao segundo álbum, certo? Foi um momento de maturação?

Foi precisamente por isso. Nós precisámos de tempo para descobrir o que queríamos fazer e depois descobrir como iríamos fazer. É um processo de redescoberta de nós próprios que exigia e exigiu tempo.

Uma coisa que eu achei engraçada. Numa entrevista disseste que se todos estivessem de acordo, é porque algo tinha de estar errado.

Pois é [risos]. É sinal que se estão a forçar a concordar, vá. Nós temos personalidades diferentes, temos percursos profissionais diferentes e gostos diversificados. É natural e saudável porque dessas diferenças surge uma música com mais personalidade.

Isso é o que torna, também, o vosso trabalho mais consistente e interessante.

Exactamente. O cruzamento dessas coisas é que torna o nosso trabalho mais rico.

É importante para vós estabelecer uma ligação intrínseca entre a imagem e a música?

Quisemos que houvesse uma associação entre as várias coisas que compõem o álbum e os concertos, mas nunca tivemos verdadeiramente tempo para pensar as coisas calmamente. Desta vez, realmente, foi diferente e isso permitiu com que a música e as várias componentes gráficas, tal como a própria capa do álbum e o videoclipe, estivessem associadas. A ideia por trás é que seria, também, uma coisa mais crua e mais dura para ir atrás da música. Acho que conseguimos esse objectivo, a associação entre os vários componentes visuais da música e a música em si.

Diz-me uma coisa, esta é a primeira vez que actuam em Trás-os-Montes não é?

Não tenho certeza, mas já estivemos em Lamego, acho que há três, quatro anos. Lamego é Trás-os-Montes.

Sim, sim

Eu tenho família em Trás-os-Montes.

Ah, então tens uma costela transmontana.

Sim, tenho família na Régua e costumo ir lá algumas vezes. Quando era miúdo ia lá muito até. Não vai haver é muito tempo para estar em Vila Real mas, sim, é bom ir a sítios novos. Já toquei em Vila Real, não com os Peixe:Avião, mas fiquei com a ideia de que é uma cidade com vontade de ver e ouvir música ao vivo.