A vergonha ou orgulho da Arte nas Barragens

O projecto arrancou em Fevereiro de 2012, mas a discussão recomeçou quando, este Setembro, foi anunciado que Joana Vasconcelos se iria juntar ao roteiro de obras de arte nas barragens da EDP. Se há artista plástica que crie controvérsia dentro do meio artístico, é ela. E não dizemos isto pelo seu processo deveras inesperado — o melhor, e recente, exemplo será a interpretação de um capacete de stormtrooper, que tocou fundo nos corações de alguns e, online, ainda despoletou uma série de Nãããããos longos e em câmara lenta, especialmente de fãs de Star Wars no momento em que ela o denomina de Crochet Vader.

@ DR

Mas o projecto Arte nas Barragens é algo completamente diferente. Já em Dezembro de 2011 o partido ecologista questionava o Ministério da Agricultura sobre a Barragem da Bemposta (Mogadouro) a.k.a. a primeira barragem amarela de Portugal, quiçá do mundo. Da autoria de Pedro Cabrita Reis, esta intervenção levantou o alarme da descaracterização do Douro Internacional, enquanto pelo outro lado se argumentava que o objectivo era criar um movimento cultural contemporâneo fazendo das barragens um conjunto relevante de intervenções de artistas plásticos conceituados. A batatada intelectual começa com um argumento bilateral: a EDP propõe-se a evitar o impacto negativo das barragens numa paisagem classificada pela UNESCO. Há os que acreditam que uma barragem amarela o faz, há os que só acreditam no absurdo da situação, paradoxo esse que é ansiosamente aumentado com o convite a Joana Vasconcelos. Teremos uma barragem forrada a arraiolos? Por outro lado, há mais lógica e menos histeria no lado arquitectónico dos convidados, como no caso de Souto Moura, que desenhou a central hidroelétrica na Foz do Tua para que o edifício fosse invisível, levando à letra a minimização do impacto destas estruturas no Douro Internacional. À lista de artistas plásticos juntam-se Pedro Calapez e Graça Morais em Venda Nova, e João Louro no Alqueva.

imagem via jornal Público

A EDP defende a questão do projecto como roteiro único no mundo, como arte pública, mas o público que convive com a barragem amarela não pensa o mesmo e não consegue concordar com a suposta redução do impacto paisagístico. Segundo o administrador da EDP, este é um novo património para a Humanidade. Calha também ser alimentado por dois milhões de euros em prol da arte e do mundo. Os Verdes não estão contentes, a Quercus não está contente, o anterior presidente da junta não estava contente, os habitantes sentem que gozam com eles e o presidente da câmara acreditava que daqui a alguns anos a cor já tinha desbotado.

Pedro Cabrita Reis é um dos artistas plásticos mais conceituados em Portugal, e deve-o a uma extensa produção e uma identidade vincada, para este projecto a ideia era homenagear a máquina, os Bobcats amarelos sempre à margem, causadores de tanto trabalho e suor. É preciso ver que a parceria da EDP com qualquer artista plástico não faria sentido havendo limitações estéticas ou processuais, com entraves toda a iniciativa passava a um projecto decorativo de faça-você-mesmo. Nesse aspecto é, sim, a criação sem limites de um roteiro contemporâneo, que estabelece novas razões para visitar a paisagem do Douro Internacional.

imagem via dourovalley.eu

imagem via dourovalley.eu

Podemos dizer que o projecto Arte nas Barragens não tem um problema de resultados, a barragem amarela fala por si, mas tem sim falhas de marketing social e comunicação da ideia: parece-nos extremamente difícil convencer alguém de que uma barragem tão fluorescente se enquadra no objectivo de minimizar o impacto da estrutura hidroeléctrica. É preciso uma revisão do argumento — não estamos tentar esconder envergonhadas estas feridas fluviais, mas queremos torná-las melhores, celebrá-las pela elevação artística e dedicação dos seus intervenientes.