LGBT em Vila Real

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A comunidade vilarealense, a par com muitas outras, olha para si mesma como homogénea. Profundamente enraizada em valores atemporais e incontestáveis do significado cristalizado do ser vilarealense, a comunidade, a par com muitas outras, procura no seu quotidiano de cidade e campo, normativisar os seus valores, deixando de lado todas as outras especificidades humanas. Assim, ser-se LGBT – Lésbica, Gay, Bissexual, Transgénero – é encarado pela política normativa e pela cultura heterossexista que domina Vila Real como um desvio patológico, uma fuga da norma, uma ameaça à própria cultura.

O resultado claro desta homofobia, isto é, do ódio explícito e generalizado que promove manifestações de violência contra pessoas LGBT, desde as agressões verbais à violência física, é a construção de identidades sexuais e identidades de género presas em complexos processos de descriminação, presas no medo da visibilidade, incapazes de se afirmarem. Em Vila Real, a predominância da ideologia heterossexista atira assim todas as pessoas LGBT, e todas as outras que não se encaixam na sigla, para uma vivência da sua sexualidade e da sua identidade de género na clandestinidade. Por outro lado, por estas identidades, sexuais e de género, se constituírem num processo complexo de descriminação promovido por uma comunidade heterossexista fechada, derivam fatores de vulnerabilidade, nomeadamente, a constante violação do direito à saúde, do direito à segurança, à dignidade, à não descriminação. Ser LGBT em Vila Real é ser-se vulnerável no cumprimento dos seus direitos enquanto cidadã e cidadão. É a constante agressão dos direitos humanos. Vila Real assiste ainda impune às atitudes homofóbicas, onde a principal forma de agressão é a verbal, legitimada na base da liberdade de expressão e na liberdade da escolha dos que agridem.

Não é justo, no entanto, dizer que em Vila Real nada mudou. Mudou muito. As conquistas do movimento LGBT no que diz respeito ao casamento, à lei da identidade de género, à co-adopção, bem como o surgimento de um movimento LGBT em Vila Real, em muito têm contribuído para alterar a intolerância, e o clima de violência, que durante anos se fez sentir. Mas essa intolerância não se transformou na integração, nem muito menos, na livre vivência entre as múltiplas identidades que constituem o que é ser vilarealense. Muito pelo contrário, mudou no sentido da tolerância que impõem limites à expressão e ao reconhecimento aberto da diversidade, que aceita a existência desde que remetida para o espaço privado, e que acha que o problema é de cada um, ou cada uma, desde que não venham para a praça. As primas que vivem juntas podem já afirmar-se como casal, mas a expressão pública dos seus afetos continua invisível e presa nos seus espaços privados ou de conforto. A tolerância com limites é uma outra forma de violência.

Na base desta tolerância com limites está o pensamento dualista, que em muito deve à ideologia cristã, e aos valores e julgamentos sobre a dualidade imposta. O LGBT em oposição ao pensamento heteronormativo continua a ser o “mau”, resultando numa incapacidade de perceber que todas as pessoas têm direto a uma vida digna e a iguais oportunidades sem serem vítimas de violência.

Perante este cenário, em Vila Real, o não revelar da homossexualidade é um processo adaptativo, um processo válido.

No entanto, continua a causar estranheza que a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, que deveria ser um espaço de resistência à normalização, incluindo da sexual e a de género, continue a reproduzir as formas de preconceito e discriminação encontradas na sociedade, continue a reforçar o carácter masculino e feminino não transgressivos e a masculinidade hegemónica. Ao contrário do que seria expectável, na UTAD reina ainda o silêncio, o tabu, a proibição do uso da expressão LGBT e a constante desvalorização das suas questões. A ditadura da heterossexualidade continua a marginalizar dentro e fora das salas, promove atitude de bullying e retrai a denúncia pois o seu silêncio parece ser a garantia da norma. E o silêncio reina em Vila Real.

Assim, importa em Vila Real que se assumam posturas reflexivas frente aos padrões heterossexuais estabelecidos, importa afirmar incisivamente a necessidade de formação profissional dos agentes em saúde e dos agentes de autoridade perante às especificidades das pessoas LGBT. Importa ter uma autárquia atenta a estas questões, e uma Universidade de resistência.